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Coluna de Sexta - 23/09/2022: O barulho do silêncio

Foto do escritor: Gustavo Tamagno MartinsGustavo Tamagno Martins

Ilustração: Pascal Campion

Dias desses precisei realizar uma entrevista com um agricultor em um distrito bem distante do centro da cidade que trabalho. Para se ter uma ideia, lá não pega nem sinal de celular (quem dirá internet). Por isso, tive que me utilizar do método antigo: ir parando nas casas e pedindo aos moradores como chegar até a propriedade do produtor. Foi um pouco estranho para quem está acostumado com localização em tempo real, mapas digitais e conversa por mensagens.


Pela estrada de chão, bem estreita, a torcida era por não encontrar nenhum outro veículo vindo no caminho inverso. A paisagem completamente cercada por árvores e pedreiras fizeram-me sentir, em certo momento, sozinho no mundo. A janela do carro, um pouco aberta, fazia entrar o ar puro e o barulho de um rio ao fundo, com as folhas das árvores se mexendo e os pneus pela estrada que parecia não terminar mais. Ao mesmo tempo em que não encontrei ninguém pelo caminho e tudo permanecia silencioso, parecia que tinha uma multidão dentro do carro. Meus pensamentos falavam alto, quase gritando. Há quanto tempo não nos víamos assim, “sozinhos no mundo”, eu e eu mesmo, para bater um papo, para desabafar um para o outro.


Antes de termos uma relação harmoniosa com as pessoas, precisamos de um convívio pacífico com nós mesmos, com o nosso próprio eu. Naquele “deserto” me reconectei. Percebi que aqui dentro tinha ligado o alerta “precisamos conversar!”. Corremos, corremos e não nos damos conta de que, às vezes, precisamos desacelerar, parar um pouquinho para escutar o que o nosso interior quer falar. E tem barulho que a gente só escuta quando faz silêncio. Naquela tarde silenciosa me reencontrei. Voltei feliz porque tinha batido um papo com meu eu interior.


O que para alguns pode parecer solidão, eu chamo de paz interior. Por vezes, precisamos desacelerar. Desconectar do mundo para nos conectarmos a nós mesmos. Silenciar para que aqui dentro possa contar o que está rolando, possa desabafar. Ouvimos tanto os outros, mas será que estamos nos ouvindo também? Nessa corrida contra o tempo, será que estamos dando pausas para apreciar o céu, escutar os pássaros e sentir o cheiro das flores? O silêncio nos faz escutar o barulho interno e nos reencontrarmos.

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